quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Seu Manuel, agora é o senhor quem fala


Arte de amar


Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus — ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.


Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.


Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
Manuel Bandeira

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Dona Clarice, hoje a palavra é sua


Sinto Saudades

Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida.
Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,
quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,
eu sinto saudades...

Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,
de pessoas com quem não mais falei ou cruzei...

Sinto saudades da minha infância,
do meu primeiro amor, do meu segundo, do terceiro,
do penúltimo e daqueles que ainda vou ter, se Deus quiser...

Sinto saudades do presente,
que não aproveitei de todo,
lembrando do passado
e apostando no futuro...

Sinto saudades do futuro,
que se idealizado,
provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...

Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei!
De quem disse que viria
e nem apareceu;
de quem apareceu correndo,
sem me conhecer direito,
de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.

Sinto saudades dos que se foram e de quem não me despedi direito!

Daqueles que não tiveram
como me dizer adeus;
de gente que passou na calçada contrária da minha vida
e que só enxerguei de vislumbre!

Sinto saudades de coisas que tive
e de outras que não tive
mas quis muito ter!

Sinto saudades de coisas
que nem sei se existiram.

Sinto saudades de coisas sérias,
de coisas hilariantes,
de casos, de experiências...

Sinto saudades do cachorrinho que eu tive um dia
e que me amava fielmente, como só os cães são capazes de fazer!

Sinto saudades dos livros que li e que me fizeram viajar!

Sinto saudades dos discos que ouvi e que me fizeram sonhar,

Sinto saudades das coisas que vivi
e das que deixei passar,
sem curtir na totalidade.

Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que...
não sei onde...
para resgatar alguma coisa que nem sei o que é e nem onde perdi...

Vejo o mundo girando e penso que poderia estar sentindo saudades
Em japonês, em russo,
em italiano, em inglês...
mas que minha saudade,
por eu ter nascido no Brasil,
só fala português, embora, lá no fundo, possa ser poliglota.

Aliás, dizem que costuma-se usar sempre a língua pátria,
espontaneamente quando
estamos desesperados...
para contar dinheiro... fazer amor...
declarar sentimentos fortes...
seja lá em que lugar do mundo estejamos.

Eu acredito que um simples
"I miss you"
ou seja lá
como possamos traduzir saudade em outra língua,
nunca terá a mesma força e significado da nossa palavrinha.

Talvez não exprima corretamente
a imensa falta
que sentimos de coisas
ou pessoas queridas.

E é por isso que eu tenho mais saudades...
Porque encontrei uma palavra
para usar todas as vezes
em que sinto este aperto no peito,
meio nostálgico, meio gostoso,
mas que funciona melhor
do que um sinal vital
quando se quer falar de vida
e de sentimentos.

Ela é a prova inequívoca
de que somos sensíveis!
De que amamos muito
o que tivemos
e lamentamos as coisas boas
que perdemos ao longo da nossa existência...

Clarice Lispector

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Minha alma canta II

Riooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo!!!

dá vontade de levantar a placa

"Eu já sabia,Galvão"

Aliás, senti falta do Galvão Bueno ao lado de Lula, Paes, Cabral, Pelé...se até o Henrique Meirelles (presidente do Banco Central brasileiro) tava lá, por que o Galvão não apareceu?

Minha alma canta, quero Olimpíadas no Rio de Janeiro...


Não é só porque estamos no Rio, convivendo com todos os problemas de violência e falta de educação a dois centímetros de distância, que ficamos insensíveis ao que temos de bom.

Hoje o bom Dia Brasil não deu as imagens da semana, como faz todas as sextas. Ele mostrou o vídeo que foi apresentado agora em Copenhague. Chorei feito um bebê.

Eu estou torcendo muito pelas Olimpíadas aqui. Apenas não acredito que vá melhorar em nada nossa vida. Sou uma desiludida porque desde a Eco92 ouço "ah, não dá pra ter Eco92 sem metrô na Barra, sem combate à violência, sem resolver o caos urbano". E tivemos Eco92, Pan e o cacete a quatro e tudo continuou uma M... muito grande e até piorou.

Portanto, minha torcida é pelo lado emocioinal, de quem ama a cidade e quer vê-la exibida aos quatro cantos do mundo.

Onde quer que eu vá,sempre carregarei este coração carioca batendo forte no peito!

Para quem não viu a apresntação, segue o link e prepare o coração. Está muito bonita.

www.rio2016.org.br

domingo, 20 de setembro de 2009

Sergio me trouxe de volta


Depois de longa ausência, só alguém muito especial para me inspirar.Ele era um carioca típico, embora fosse antes de qualquer coisa um cidadão do mundo. Bonito, sorriso perfeito, espontâneo, carismático. Adorava entrar no mar do Arpoador. Depois de tantas voltas ao mundo, era naquele pedaço do Oceano Atlântico o local no qual, em suas próprias palavras, recuperava suas energias.
Dedicou-se às causas humanitárias a ponto de galgar o mais alto escalão de executivo internacional na Organização das Nações Unidas (ONU). Governou (sim, governou) o Timor-Leste tão logo o país tornou-se independente da Indonésia. Embora tivesse recebido para esta função autoridade máxima, conseguiu conduzir de forma democrática a transição para um governo genuinamente timonês. Nas ruas daquela ponta de ilha asiática, era saudado como uma celebridade.
Não era um homem de família. Casou-se uma única vez , mas não teve tempo de acompanhar o crescimento de dois filhos. Era, sim, de namorar e se apaixonar ao longo de tantas missões diplomáticas ao redor do mundo. E não estamos falando de morar na Piazza Navuona ou participar das recepções em salões parisienses. Estamos falando de missões no Camboja, de negociações com líderes do sanguinário Khmer Vermelho. Estamos falando de assentar refugiados de guerra na Somália .
Estamos falando de Sergio Vieira de Mello, o alto comissário da ONU morto em agosto de 2003, em consequência de um atentado terrorista na sede da organização no Iraque. Ontem foi apresentado, à imprensa e convidados, o documentário SERGIO, UM BRASILEIRO NO MUNDO, de Greg Barker. Estados Unidos, 2009. 94min.
Na telona, a trajetória do diplomata brasileiro. Estará em cartaz no Festival de Cinema do Rio na mostra “O Brasil do Outro”, com documentário de estrangeiros sobre o país ou sobre algum brasileiro.
Imperdível. Não somente porque dá orgulho ver gente como Condoleza Ricce, Tony Blair e até George W. Bush falando bem do compatriota . Mas principalmente pelo nó na garganta que dá a estupidez do episódio.
Seja pela falta de estrutura – e até por uma certa má vontade das tropas americanas – para socorrer as vítimas do atentado. Seja pela inacreditável forma como se chega à morte do mais alto executivo da ONU no Iraque. Foram três horas de tentativa de resgate. Dói saber que Sergio chegou a ser encontrado vivo embaixo dos escombros. Mas a dificuldade de tirá-lo de lá falou mais alto.
E o mais importante: é uma delícia ser apresentado ao Sergio. Um homem bacana, que pode ter lá tido seus problemas com a mulher, ter sido meio omisso com os filhos, mas no fim das contas, fica o questionamento: é possível conciliar causas humanitárias de dimensão universal com a pacata vidinha de pai de família? A omissão de um lado justifica a dedicação ao outro?
Sem juízos de valor, dá para até verter umas lágrimas ao escutar a última namorada e companheira de jornada no ativismo social, Carolina Larriera. A moça ficou conhecida pelas imagens que rodaram o mundo, tentando entrar nos escombros da sede da ONU, já em ruínas. A argentina está lá, falando de um Sergio que nós não tivemos a oportunidade de conhecer, mas que dava para ter uma ideia, olhando para aquele sorriso e jeito de ser tão cariocas

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Verduras, amor e as impossibilidades


Hoje é dia dos namorados e resolvi falar daqueles amores impossíveis. E nem me refiro aos dramas de rejeições e paixões não correspondidas pelas quais todo mortal comum já passou. Refiro-me àquelas circunstâncias, nas quais eventualmente nos encontramos, de sentir atração pelas “pessoas erradas”. Exemplos: o professor casado e muito mais velho; o amigo do filho e muito mais novo; o chefe; o namorado da melhor amiga; o porteiro do prédio; o atendente da lavanderia; ou o homem que pesa legumes no supermercado.


A gente não sabe explicar porque, mas sente aquela queimação na pele só de olhar para o cidadão. É tudo físico, químico, biológico, sei lá, mas o certo é que – talvez por sermos chimpanzés, mas chimpanzés racionais – tratamos logo de usar a razão e reprimir bem reprimido este raio deste sentimento.


Como sou tão chimpanzé como qualquer humano, é claro que também passo por isso. Tudo começou por causa de uma rúcula. Eu procurava por uma rúcula dentro deb um supermercado quando perguntei ao rapaz arrumando as caixas de legumes se realmente não tinha rúcula.


Este rapaz seria uma daquelas pessoas invisíveis, das quais nunca nos damos conta da existência, não tivesse ele olhado para mim com um olhar intenso e de cima abaixo e falado com voz de barítono “Eu vou arrumar uma rúcula bem bonita pra você”. Achei uma ousadia ele me chamar de você, mas gostei.

Depois de cinco minutos ele volta com as mãozinhas pra trás e “saca” o molho de rúcula, me entregando como se fosse um buquê de flores. O pior foi a minha reação. Eu fiz uma cara de surpresa e soltei “Ah! Que linda! “ (a rúcula realmente estava bonita). O moço sorriu de orelha a orelha e perguntou “Gostou?”. Eu disse “Adorei!”. Depois, cai em mim e fui ao caixa pagar. Mas desde então nutro uma paixão platônica pelo verdureiro.


Dias depois, acordo eu às 8h30 para fazer uma caminhada antes de o sol ficar insuportável. O dia estava lindo no Rio de Janeiro, o Aterro do Flamengo cheio de gente me faz acabar a caminhada feliz e com vontade de comer melancia. Dirijo-me até o supermercado Zona Sul da rua Marquês de Abrantes, sem a menor esperança de encontrar o verdureiro, afinal, são 10 da manhã e ele trabalha à noite.

Entro no supermercado e não encontro nenhuma melancia nas gôndolas. Pergunto a um rapaz que arrumava as tangerinas "Não tem melancia"?


Aí o rapaz fica olhando por cima da minha cabeça, como se tentasse entender o que alguém estaria falando por trás de mim, Viro e quem eu vejo? O "verdureiro" (na verdade “verdureiro” é um apelido sucinto para o homem que pesa os legumes do supermercado Zona Sul da Marquês de Abrantes, o da rúcula).

Viro de volta para o rapaz a quem perguntei originalmente sobre a melancia e ele me responde "Ele vai pesar para a senhora", apontando para "o verdureiro".


Mas não acabou ali a história. O raio da melancia não chegava e resolvi me ocupar pegando um pão, um litro de leite, tomando uma água de coco, enfim... finalmente surge "o verdureiro" carregando dois pedaços de melancia.

Perguntou se eu queria o maior ou o menor e pediu desculpas pela demora. Eu falei que não tinha problema, mas eu estava sem graça, com vontade de rir.


Aí, quando "o verdureiro" já pesava o pedaço escolhido o rapaz que tinha me atendido no começo grita "E aí, Levi (descobri o nome dele), botou adoçante pra ficar bem docinha", Levi responde "Claro, não tô de bobeira não". Senti meu rosto pegar fogo.Como não sabia o que falar disse "É , ela ( a melancia) está cheirosa".

Levi deu uma gargalhada e disse "É, bem cheirosa". Não sabia mais onde enfiar a minha cara. Ainda pesei um Kiwi e uma fruta de conde para disfarçar, e corri para o caixa. Mas a história não terminou.


Já no caixa aparece na tela, que vai mostrando o nome e o preço das coisas, a seguinte descrição de um produto: "Aipim Tipo exportação". Aí eu falei pra moça "Eu não comprei aipim". A moça olhou para a tela e foi na bolsa olhar o que ela tinha acabado de registrar. ERA A MELANCIA.


A moça do caixa vira-se para o rapaz que me atendeu originalmente e fala "Eu hein, quem pesou esta melancia aqui?". O rapaz responde "Foi o Levi". A mocinha continua "O Levi tá maluco? Pesou a melancia com o código do AIPIM, eu hein".


A minha sorte é que o Levi não estava mais na seção de legumes porque o cara deu um risinho muito do safado e procurou por ele com os olhos, certamente na intenção de fazer alguma piadinha. O pior foi a minha vontade incontrolável de rir. Pelo jeito o verdureiro pesou a minha melancia com a cabeça no aipim tipo exportação.


Agora me respondam: pode dar certo algo que começa com um buquê de rúcula e acaba com aipim tipo exportação?

terça-feira, 2 de junho de 2009

A última mensagem

Era o dia 1º de junho e ela acordou radiante. Aquele dia primeiro seria o primeiro dia de uma nova fase de sua vida. Tirou o filhinho, de um aninho ainda incompleto, do berço e o rodopiou cantando “Onde você estiver, não se esqueça de mim”, no melhor estilo Nana Caymi durante o especial do Rei...

Lá fora, a chuva caía como há muito tempo o Rio não via numa manhã, mas seu coração estava sob o efeito do Sol. Riu ao lembrar-se daquela cartomante, lá atrás no tempo, consolando-a pelo inconformismo do recente amor perdido.
– Minha filha, não se preocupe... esse homem de agora já passou. No momento você só vê trevas, mas o sol está a caminho.

Incrédula, não aguentava mais sofrer desilusões, no dia que o conheceu, rechaçou-o com todas as forças. Mas como um bom Sol, ele teve forças mesmo diante de nuvens carregadas. O tempo abriu e ela deixou o Sol entrar em sua vida.

As coisas não foram fáceis. Mudanças para o exterior, virar dona de casa de uma hora para outra, logo ela, tão profissional, tão cheia de talentos. Veio depressão, vieram ausências dele por excesso de viagens. O céu ficava nublado por vezes, mas o Sol sempre vencia.

Veio o bebê, vieram mais mudanças. Veio uma boa proposta de emprego para ela em outra cidade, vieram novos desentendimentos.

Mas naquele domingo, naquelezinho dia tão feliz, todas as nuvens pareciam ter sido dissipadas. Foi um dia de planos. Foi um dia de decisões. Ela pediria demissão, ele sugeriu ajudá-la a abrir um negócio na outra cidade.

Ele não queria que ela o levasse ao aeroporto, então, despediram-se quando táxi chegou. Ela correu para comprar o vestido, pois ele voltaria no Dia dos Namorados.

Mas naquele dia primeiro, conforme ela mesma previra, tudo seria transformado. Um telefonema, depois outro, depois outro e a confirmação como um rombo na fuselagem.

Por um momento pensara: “não, não...ele embarcou no voo das seis horas. Nnão, talvez no das sete e meia..." Correu para o celular. Lá estava a mensagem implacável:

31/05/2009 19h03 Voo saindo no horário. Bjs. Te amo.

Como ele estava com muito sono, ela respondeu:

31/05/2009 19h05 Te amo. Descanse em paz

Qual é o limite para suportar uma dor? A bela filha de espanhol me diz com lágrimas nos enormes olhos de Mangá:

– Almodóvar desta vez extrapolou...

Eu ainda consegui sorrir, mas nos abraçamos em soluços.

Quando nos conhecemos, brincava com ela a respeito do pai espanhol e dos episódios “almodovorianos” de sua existência. Dizia-lhe que o roteiro dos acontecimentos pelos quais passava era escrito pelo cineasta espanhol e mandado para o Destino. E ela sempre respondia
– Não minha amiga, se o Almodóvar filmasse minha vida, diriam que ele foi inverossímil demais...

O Sol se pôs ao norte do Atlântico. E desta vez teve não teve a menor graça...

Homenagem à amiga que perdeu seu amor no voo AF 447 da Air France e a todos os amigos, familiares e amores dos passageiros que lá estavam.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Como se diz "tô com saudade"...

Peguei carona na mensagem da amiga La Baronne. O vídeo abaixo é um presente que um amigo desta amiga fez pra namorada que foi estudar em Paris.

http://www.youtube.com/watch?v=hQm9POgvq9c

As pessoas do começo são desconhecidas do casal. A partir do cara com blusa do Fluminense, são todos conhecidos (amigos, familiares...).

Uma simples e criativa forma de dizer "estou com saudade"

Na boa...se um dia um homem faz um vídeo desses pra mim eu sou capaz de engravidar de quíntuplos, largar o jornalismo e voltar de Paris para morar na roça!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Double Fantasy

Tenho uma grande amiga, a Jubs, que gosta – acredito apenas pra me provocar – de dizer o quanto tem medo. Eu acho engraçado ela ter medo justamente das coisas para as quais eu a considero a mais capaz das criaturas. Mas basta eu a ouvir dizer “eu tenho medo de...” para responder o seguinte
“Don’t be affraid to go to hell and back, don’t be affraid to go to hell and back, don’t be affraid to be affraid” (Não tenha medo de ir ao inferno e voltar, não tenha medo de ir ao ínferno e voltar, não tenha medo de sentir medo).

Trata-se do refrão de “Beautiful Boys” letra de Yoko Ono e música de John Lennon, interpretada pela própria senhora Lennon, a japinha acusada de ser o estopim do fim dos Beatles. Favor não confundir com “Beautiful Boy”, assim no singular, letra e música do Lennon, canção um pouco mais manjadinha, nem por isso menos linda.

Voltando aos “Garotos Lindos” da Yoko. Recentemente rolou um papo com a Jubs por e-mail. Ela, então, acabou por procurar a música e baixar. Ouviu e leu a letra pela primeira vez (em tempo, a amiga nem era nascida quando o Lennon levou um tiro, quanto mais quando o disco “Double Fantasy”, que continha a música em questão, foi lançado).

Recebi o arquivo da canção e, ao ouvi-la após longo tempo, me debulhei em lágrimas.

Para se entender o contexto histórico da minha reação será preciso viajar no tempo: o álbum “Double Fantasy” já havia sido devidamente adquirido por meus pais, ambos da geração Beatles e amantes de Lennon e Cia. No dia em que o estampido de uma bala ressoou em frente ao edifício Dakota e deu fim ao mais amado dos quatro garotos de Liverpool, a capa com a bela foto em preto e branco do casal estava na estante.

Eu tinha apenas 10 anos e lembro de minha mãe chorando e colocando o disco depois de ouvir a notícia no rádio. Naquela mesma semana, voltando do curso de inglês, achei nas bancas uma revista com todas as letras e traduções do repertório do Lennon.

Comprei para dar a minha mãe e ela ficou toda feliz. Mummy, mestre em literatura brasileira e bacharel Francês, não sabe falar nem I love you na língua de Shakespeare, talvez por isso tenha curtido tanto o presente. Como uma criança curiosa e estudante de inglês, eu acabava por acompanhar com ela as letras e músicas.

Desde então, nunca mais me saíram da cabeça os versos daquele refrão. Alguém dizendo para nunca ter medo de ir ao inferno e voltar. Com minhas crenças ainda em formação, de alguma forma era confortante saber ser possível, uma vez chegando ao inferno, poder voltar quando quisesse.

O alerta seguinte também intrigava: nunca tenha medo de sentir medo. Outro conforto. Passei a lembrar dessa frase cada vez que senti medo e isso, de certa fora, me acalentava. Afinal, se não é para ter medo de sentir medo, então não precisa ter medo. A vida parecia muito simples assim.

Cresci, deixei de ouvir discos, cheguei a comprar o CD, mas sumiu em uma das mudanças de casa e agora me reencontrei com “Beatiful Boys”. A música causa estranhamento. Os ouvidos ocidentais estão pouco acostumados ao metal da voz de Yoko. Mas a letra é maravilhosa.

A musa de Lennon foi muito sensível ao resumir o marido e o filho Sean. Não consigo descrever, tamanha sutileza oriental de cada estrofe.

Em tempo: nunca achei Yoko responsável por nada de ruim na vida de Lennon. Achava o amor deles uma coisa maravilhosa, a possibilidade do grande encontro, de se viver essa roca amorosa em uma existência. Mesmo sabendo que acaba. Acabou com um tiro no caso deles. Acaba como a adaga de tantas impossibilidades em outros casos. Mas a fantasia de viver este sonho continua. Fantasia em dupla, fantasia em dobro.

Ouça a canção, siga a letra e nunca tenha medo de sentir medo.


Link para a canção no YouTube


Beautiful Boys


You're a beautiful boy
With all your little toys
Your eyes have seen the world
Though you're only four years old
And your tears are screaming
Even when your smiling
Please never be afraid to cry

You're a beautiful boy
With all your little ploys
Your mind has changed the world
And you're now forty years old
You got all you can carry
And still feel somehow empty
Don't ever be afraid to fly

All you beautiful boys
Creating multiple plays
You like to fence in your world
And settle down when you're old

You can run from pole to pole
And never scratch your soul
Don't be afraid to go to hell and back
Don't be afraid to go to hell and back
Don't be afraid to be afraid

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Febre do Feno


"A primavera traz uma agradável sensação de recuperação de vida, após o escuro e frio inverno. É a época de acasalamento das espécies animais, de (re)nascimento da natureza. Com este renascimento as flores desbrocham, as árvores também. Começa a polinização. Muitas plantas utilizam insetos como ‘polinizadores’, mas outras tantas utilizam o vento. Isto significa que o ar se torna um verdadeiro coquetel de pólens. E o que significa isto para muitos de nós?"


Retirei isso de um site que explica o que vem a ser a tal febre do feno. Trata-se, simplesmente, de uma alergia desencadeada pelo excesso de polinização no ar, especialmente na época de primavera.


Em minha existência pouco erudita, porém, ouvi a vida inteira um amigo gaiato dizer "Ihhh, fulano (ou fulana) tá com a febre do feno". Geralmente ele se referia àquela fase da vida em que o negócio é 'polinizar'. Não importa se é cravo, gerânio, tulipa ou flor de cáctus. A natureza grita e não convém ficar guardando o pólen para a posteridade.


Pois bem. Não sei se é hormonal, se realmente tem a ver com o clima - e esse outono no Rio é mesmo convidativo - ou se é o massacre da mídia em torno do maldito Dia dos Namorados. Só sei que ando sentindo minhas defesas imunológicas prontas para se renderem à febre do feno...


Qual é a vacina, hein?