Reluto sempre em falar sobre religião. Não por considerar um tema polêmico, mas porque é assunto tabu – assim como dinheiro – para muitas pessoas. Vivi boa parte da minha vida como o personagem representado por Woody Allen no filme "Hanna e suas irmãs", dirigido pelo próprio Allen. No filme, o diretor empresta seu talento de ator para transitar pelos cultos das mais diversas religiões, no afã de obter resposta para uma simples pergunta: "Qual é o sentido da vida?".
As situações hilariantes vividas pelo personagem são frutos da genialidade do diretor americano, mas nem por isso são menos inverossímeis. Passei por momentos semelhantes quando resolvi que queria abraçar uma religião. Nascida em uma família matriarcal, na qual minha avó – a líder suprema da ordem dos Cardosos – era comunista de carteirinha. Fui criada longe da igreja e nem sequer fui batizada. Acabou sendo bom. De uma certa forma, a ausência de dogmas familiares permitiu-me dar vazão à curiosidade e passei a gostar muito de ler e conhecer sobre absolutamente todas as religiões do mundo.
Depois de muita busca e de me abrir aos estudos mais variados, abracei o budismo em 2005. Assim como o cristianismo ou o islamismo, o budismo também tem suas vertentes variadas. Converti-me a um tipo de budismo oriundo do Japão, que prega, antes de tudo, que os ensinamentos de Buda devem ser postos em prática na vida diária. Ou seja, encontrar a paz interior isolado em um mosteiro ou abdicando da vida em sociedade e dos prazeres mundanos é até relativamente fácil. Difícil é praticar o desapego e entender as leis que regem o universo tendo que trabalhar todos os dias, pagar as contas do mês, enfrentar o trânsito e a violência urbana e ainda ter que conviver com as pessoas, muitas vezes tão diferentes de nós. Ou o pior: tendo perdido algo ou alguém por quem estivemos apegados com todas as forças.
Uma constatação importante em minha peregrinação em busca do sentido da vida foi entender que, na essência, todas as religiões são bem parecidas. Absolutamente todas têm como preceitos básicos a paz e o fortalecimento do indivíduo. Atribuindo poder a Deus, ao Universo, aos elementos da natureza ou a si próprio, as religiões ensinam os homens a viverem mais felizes. Na essência, todas as religiões são caminhos para atenuar a dor e o sofrimento existenciais. Qualquer manifestação bélica e conflituosa em nome de religião, portanto, é mera distorção humana.
Perdida em meio ao sofrimento, buscava conforto na leitura dos periódicos usuais quando deparei-me com a bela matéria da repórter especial da revista Época, Eliane Brum. A jornalista encarou um retiro espiritual de dez dias, no qual não era permitido sequer falar. Meditação de 12 horas diárias e mais o isolamento empurram-na para dentro de si própria de forma avassaladora. Esta viagem para dentro de si nem sempre é confortável, mas pelas 12 páginas que suscitaram da experiência, entitulada "O inimigo sou eu", fica evidente que é sempre edificante. Recomendo a leitura. (clica no link)
Para quem não tiver tempo de lê-la toda agora, segue uma ‘palhinha":
"Vipássana significa "insight", "visão interior". Segundo seus mestres, é a meditação usada pelo próprio Buda, 2.500 anos atrás, em sua busca pela iluminação. Ao longo dos séculos, foi sendo corrompida e se diluiu na Índia. Manteve-se, porém, em Mianmar, antiga Birmânia, país que virou manchete da imprensa mundial no fim de setembro, quando monges budistas entraram em sangrento confronto com o governo militar pelas ruas do país. Goenka é hoje o mestre de vipássana mais conhecido e o principal divulgador da técnica pelo mundo(…)
A idéia básica está presente em diferentes linhas do budismo: o que nos faz sofrer é o apego. Na vida, o apego se manifesta por uma reação de cobiça ou aversão. Queremos continuar sentindo o que nos dá prazer e não aceitamos sentir o que nos causa algum tipo de dor. Se aprendermos a arte do desapego – ou seja, não cobiçar o prazer nem sentir aversão pela dor –, a fonte do sofrimento estanca. Para isso, precisamos compreender que a vida é impermanência. Que nada dura, nem o prazer nem a dor. É necessário realmente entender que tudo é efêmero e, portanto, só a ignorância nos leva a qualquer tipo de apego – e ao sofrimento"
Depois de ler a matéria, apreendi uma lição recebida involuntariamente no último sábado - uma das causas do meu sofrimento.
Serei feliz com, sem ou apesar das coisas e pessoas as quais sou apegada.
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