segunda-feira, 16 de junho de 2008

Eu quero lutar, mas não com essa farda

O título do post é o verso de uma música do conjunto de rock Ira!, sucesso dos anos 80, década marcada pelo estouro dos rock Brasil e também pelo apagar das luzes da ditadura militar.

Depois que a ditadura acabou, as forças armadas andaram meio sem saber qual era a parte que lhes cabia neste latifúndio chamado Brasil, recém-adentrado no processo democrático.

Depois de mais de quase 20 anos de democracia, eu juro que achei que as forças-armadas estavam renovadas, sem o ranço truculento dos anos de chumbo.

Aí o rio vira novamente as manchetes nacionais, com o caso dos três moradores do Morro da Providência, mortos com a ajuda do Exército, por traficantes do Morro da Mineira, rival da Providência na guerra do tráfico de drogas carioca.

A rua onde trabalho fica ao lado do Morro da Providência.
Em dezembro de 2007, eu saia do trabalho com um colega de redação. Passamos ao largo da subida do morro. Avistei os caminhões do Exército despejando dezenas de soldados com seus uniformes camuflados e fuzis nas mãos. O objetivo: vigiar obras patrocinadas pelo senador Marcelo Crivella, com verba do Ministério das Cidades. Na ocasião, comentei que a presença do Exército na comunidade não daria certo. Cedo ou tarde, alguma bomba iria estourar, afinal, pelo que me consta, o papel do Exército é lutar pela soberania nacional e não 'proteger' operários que trabalham em obras nas favelas. Aliás, para a mesma instituição que em 1988 matou três operários em greve na Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, o atual apreço pela classe operária chega a ser comovente.

Não concordo com o porta-voz do Exército, que disse que o caso dos três rapazes entregues ao tráfico do morro inimigo seja um 'fato isolado', de maus profissionais. O fato é conseqüência pura e simples da sucessão de erros da adminsitração pública, que ainda não aprendeu que os soldados, cabos e oficiais de Exército, Marinha e Aeronáutica são treinados para a guerra. Qualquer missão, portanto, que seja a eles designada, será tratada com a preparação e o aprendizado de combatentes em missão de guerra.

Independente de os três rapazes serem ou não pessoas de bem, isso não vem ao caso no momento. O que vem ao caso é que, na guerra, quem faz oposição é o 'inimigo'. E inimigo, na concepção deles, é mesmo para aparecer morto nas 'trincheiras' dos aterros sanitários de Gramacho ou de qualquer outro lugar...

Só esqueceram de medir os efeitos desta estratégia de guerra burra e desumana.Cada vez que um episódio envolvendo Forças Armadas e covardia acontece, me remete imediatamente ao ranço da ditadura militar, ocasião na qual mandos e desmandos da caserna prevaleciam sobre a justiça.

Ninguém está se sentindo mais seguro com a presença do exército por aqui. Pelo contrário, eles se recusam a sair - é claro, isso seria reconhecer a 'derrota' - e agora, aumentou o risco de quem mora ou trabalha nas adjacências do Morro da Providência.E é claro que se amanhã ou depois outras pessoas forem mortas, feridas ou queimadas em ônibus, será apenas 'mais um ato isolado' para as autoridades militares.

Eu quero lutar pela presença do Estado em locais carentes, a fim de evitar ocupação do tráfico, de milícias ou de forças armadas truculentas.

Pensemos nisso na hora de eleger os prefeitos: que o Estado ocupe os morros com saúde, educação e lazer e não com a farda da violência.

Um comentário:

Antonio Santo disse...

Sobre o final do seu post, referente à escolha do prefeito. Está a frente nas pesquisas, o mesmo Marcelo Crivella que já usou uma vez o Exército! Bem... Beijos e bem vinda, já estava sentindo saudades de suas postagens.